Mónica Gonçalves

Mónica Gonçalves, a cientista da Moda

Vamos falar-lhe de moda e da produtora Mónica Gonçalves. E agora, ao pensar no espaço de trabalho onde a obra nasce, é normal que comece a imaginar um cenário típico de atelier de costura: com as devidas máquinas, tecidos, linhas, fitas métricas, agulhas e desenhos.

Pelo contrário, vamos pedir-lhe que imagine uma casa, o ambiente familiar, materiais naturais (como cascas de bananas) utensílios de cozinha e outros com que se cruze nas rotinas diárias, um bloco de notas e um relógio na parede a marcar horas tardias.

Este é o cenário em que Mónica Gonçalves, 32 anos, produtora de materiais naturais para moda, trabalha. É em casa, experiência após experiência, que dá nova vida a materiais naturais e possibilita que, através deles, peças de vestuário, acessórios de moda e artigos de decoração originais surjam.

A “máquina de costura” de Mónica funciona assim mesmo: misturando químicos, aguardando reações, comparando resultados, substituindo substâncias, melhorando processos até chegar à fórmula perfeita.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

“A ignorância faz com que não tenhamos medo de experimentar. Eu não sou química, tenho noções dos materiais com que trabalho e crio paralelismos. Vou experimentando, pondo em hipótese possíveis comportamentos. Pesquiso, estudo o material e não desisto”, explica Mónica.

Esta tendência para ser um género de “cientista da moda” foi cultivada desde cedo. Em casa, na Póvoa de Santa Iria, Mónica esteve sempre atenta às roupas feitas pela mãe, que é modista, e aprendeu a alinhavar desde cedo. Da irmã adquiriu o gosto pela ciência e pelos processos, do irmão veio o interesse pelo desenho. Do pai, engenheiro de aviação, a curiosidade pelos materiais e a vontade de pôr as mãos na massa, literalmente, pois houve alturas em que até o cimento foi inspiração e material de trabalho que levou para a sala de aula do curso de Design de Moda, na escola Modatex.

“Fui sempre muito estimulada para a experimentação, primeiro em casa, depois na escola com os professores. Enquanto os meus colegas iam para as aulas com rolos de tecido, eu levava, por exemplo, argamassa”, ilustra a criadora.

Não tardou a que a criatividade de Mónica fosse notada.

Em 2009, representou Portugal em Berlim, no festival “Romenios” onde apresentou uma mini coleção, ainda em contexto académico, e ganhou o primeiro lugar. Depois, em 2010, venceu o Campeonato Europeu “Euroskills” na categoria de Design Moda. Em 2012 somou à lista de distinções o primeiro lugar no concurso “Ecofriendly” com a apresentação de um projeto realizado em cortiça.

Ao currículo de Mónica somam-se outras tantas conquistas: estagiou na empresa Isilda Pelicano, trabalhou em Itália na reconhecida marca Barena (onde se especializou em materiais naturais), desenvolveu uma coleção para a Cork and Company, foi selecionada no programa televisivo Shark Tank e teve ainda uma rubrica televisiva onde deu dicas sobre como dar vida a diferentes objetos.

“Não tenho dúvidas de que as pessoas com que me fui cruzando e continuo a cruzar são impulsionadoras das minhas conquistas. Para além disso, luto bastante para alcançar qualquer objetivo a que me proponho e só paro quando consigo. Respeito os tempos e os passos – que são dados com equilíbrio -, e é desta forma que tenho conseguido crescer e alcançar estas conquistas”, reforça.

Embora tenha sido a cortiça que até então tenha destacado o trabalho de Mónica Gonçalves – uma vez que foi ela quem descobriu e criou do fio de cortiça (do qual tem a patente) que passou a dar nova vida às peças de vestuário e acessórios de moda e de decoração com este material, a artista não para de inovar e o seu trabalho está a dar cartas com o resultado de outras experiências bem-sucedidas com materiais naturais.

O mais recente material que ganha destaque e nova vida pelas mãos de Mónica é a casca de banana. O interesse pelo material surgiu após um convite da marca Sonae, para a conceção da capa do seu livro Inovação 2018.

Por forma a combater o desperdício de casca de bananas das suas lojas, a Sonae desafiou a artista a fazer jus ao título do livro – Inovação -, dando-lhe caixas e caixas de cascas de bananas para que do seu laboratório fizesse surgir a tão esperada capa do livro.

E assim foi.

Pouco tempo depois, Mónica é contactada por uma marca italiana, a Meraky, que pretendia participar num Concurso Europeu de Inovação, o “Worth Partnership Project” com um novo produto.

“Foi muito curioso, esta equipa que é italiana descobriu-me no Alentejo. Ligaram para uma associação de artes do Alentejo, para se informarem sobre possíveis profissionais que desenvolvessem materiais e falaram-lhe de mim. O passa a palavra é mesmo muito importante”, acrescenta.

Mónica não teve dúvidas sobre com que produto trabalhar come esta marca italiana: a casca de banana.

À equipa que confiou de imediato no trabalho da produtora, explicou: “há um imenso desperdício de casca de banana mundial e eu estou disponível para criar um novo tipo de couro que não parte da pele de animais”.

Seis meses de experiências depois, o couro de casca de banana ganhou vida, foi apresentado ao mundo no Concurso de Inovação e arrecadou o seu primeiro prémio. Foi desta forma que mais uma patente foi adicionada ao histórico profissional de Mónica.

A partir do couro criado pela artista, a marca italiana produziu malas.

“As malas têm estado a ser vendidas muito bem! A equipa italiana foi bastante exigente e não poderia ser de outra forma. As malas são muito resistentes, tal como o couro/camurça tradicional”, explica a arista.

Daqui para a frente, novos materiais naturais vão ser trabalhados pela artista. Mónica quer forcar-se noutros coros a partir de materiais vegan, como a alfarroba e a caseína do leite em fim de vida (faziam-se botões a partir dela). Ainda não tendo ido para a fase de experimentação, estes materiais parecem-lhe ser bastante promissores.

Resta aguardar para ver o que aí vem e o que vai poder usar a partir de mais materiais naturais transformados por Mónica Gonçalves.

Uma coisa é certa: dela vai poder sempre esperar qualidade e respeito pelo ambiente

 

 

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